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A Expressão, a Identidade e a Orientação

Daniela Filipe Bento Daniela Filipe Bento Seguir 15 de dezembro de 2014 · 4 mins read
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Expressão, Identidade e Orientação (e mais alguns) são termos comumente usados dentro da temática da sexualidade. Não irei usar a sigla LGBT, pois não queria escrever sobre comunidade nenhuma em particular. Estes termos tocam a todos, não são filosofias de vida, não são ideais. São definições que se ajustam a determinadas características. Partir da premissa que se deve falar em filosofia ou ideal de vida é, na minha opinião, errado.

Escrevo sobre este tópico, dado que, com a vivência do dia a dia, tenho percebido que é frequente a dificuldade em compreender algumas diferenças significativas. Porém, é importante frizar que explicar estas diferenças não significa separar as pessoas, categorizá-las ou demarcar as diferenças de uma forma prejurativa e/ou benéfica. O objectivo é apenas elucidar para alguns conceitos que são importantes na compreensão da “pessoa”.

Existem uma série de termos importantes, mas só queria desenvolver estes três. De uma forma resumida:

  • Expressão de Género está de acordo com o maneirismo, a forma de vestir, a apresentação, aspecto, gostos e atitudes. É social e cultural. É por esta forma que cada um expressa o seu “eu” com o mundo. Simplificando, é a forma social do género.

  • Identidade de Género está relacionada com a experiência interior, emocional e pessoal do “eu” para com o mundo. Pode ou não corresponder ao seu sexo biológico.

  • Orientação Sexual define a atração física, emocional e psicológica de um “eu” por outro indivíduo de um sexo em particular. As orientações mais conhecidas pelas comunidades são a heterossexualidade (sexo oposto), homossexualidade (o mesmo sexo) e bissexualidade (ambos os sexos).

Por vezes, sinto que existe uma clara dificuldade em distinguir estes três elementos do quadro. Nenhum deles é vinculativo na medida em que a definição de um, faz a definição do segundo e terceiro. Para que a minha opinião seja mais simples de transmitir vou juntar os termos dois a dois.

Começando pelos dois últimos, identidade e orientação. É necessário e importante entender que a identidade está ligada ao eu, interior e a orientação está ligada ao outro, exterior. Qualquer forma de identidade pode-se expressar de qualquer forma de orientação. Um rapaz é hetero/homo/bi, (…), uma rapariga é hetero/homo/bi, (…), um transgénero é hetero/homo/bi, (…). Independentemente de como as relações funcionam entre si (seria outro tópico), a atracção pelo outro não se define pela visão de mim. Simplificando, penso que eu não me sinto atraída por rapazes ou raparigas por ser eu me sentir eu própria um rapaz ou uma rapariga (claro, com a resalva de que tudo isto é mais complexo, estou a tentar simplificar). Trocando os intervenientes, o outro sente-se atraído por um (ou mais) género independentemente da sua própria identidade. Nesta visão simplificada, o que altera é a relação entre estes dois indivíduos, a sua atracção implica “a identidade” do outro e, essa característica, é intrínseca a cada um.

Com este último ponto podemos criar diversas possibilidades no par identidade/orientação e, nenhuma é menor que a outra, nem maior. No fundo são todas formas de gostar e amar, são resultado de juntar o eu interior com o eu exterior, a projecção interior e a projecção exterior. Todas são - usando um abuso de linguagem - equiparáveis e equivalentes. Na minha visão pessoal, estas projecções são também mutáveis no tempo, oscilatórias. Não no sentido em que não transmitem permanencia, mas no sentido de que o outro pode ou não fazer-nos descobrir em nós algo que não conheciamos. Como se costuma dizer: “eu gosto de raparigas, mas nunca sei se algum dia algum rapaz vai mexer comigo”. Esta é, talvez, uma das maiores negações. A dificuldade em entender que a absolutismo não existe (“sou, ponto”).

Fazendo par entre expressão e orientação, penso que exprimir o meu género de acordo ou contra as normas e convenções sociais não é taxativo na minha visão para com o outro. É comum, em comentários, brincadeiras e em ideias mais desenvolvidas, existir uma tendência para criar permissas sobre a orientação de alguém devido à sua forma de expressão. Ainda que, em muitos casos, exista uma ligação é importante referir que não é vinculativo. A minha expressão não afecta o meu modo de ver o outro, logo não afecta a atracção que possa ter por ele. Exprimindo-me eu enquanto rapariga, rapaz, andrógeno… Ser feminino não significa gostar de rapazes ou vice versa. Expressão é isso mesmo, expressão, uma forma de ser, mas não caracteriza a forma de gostar do outro. Por outro lado, o par expressão e identidade já tem elementos mais próximos. Apesar da noção que a expressão de género está próxima da identidade é preciso ter em atenção que a expressão pode assumir contornos muito diferentes da própria identidade (o crossdressing e travestismo são exemplos claros), em que esta seja posta em causa.

Na realidade, poderiamos escrever muito sobre este tópico. Levantando algumas questões interessantes, que talvez muitos não se perguntaram:

  • Uma rapariga transsexual que gosta de raparigas, é homosexual ou é hetero?

  • Um rapaz transsexual que se expressa na mesma como rapariga, qual a sua identidade?

  • Um rapaz que gosta de rapazes e raparigas expressa-se como andrógeno?

  • Um rapaz transsexual bissexual, é definido como hetero/homo/bi?

Todas estas questões têm respostas simples e… mas de entendimento pessoal mais complicado. São apenas algumas perguntas que baralham quando não se tem a informação suficiente.

Dani Bento

Daniela Filipe Bento

Escrito por Daniela Filipe Bento Seguir

escreve sobre género, sexualidade, saúde mental e justiça social, activista anarco/transfeminista radical, engenheira de software e astrofísica e astronoma